quinta-feira, 14 de maio de 2009

Ensino Tecnico Profissional em Mocambique


1. INTRODUÇÃO
Está a assistir-se, em Moçambique, a uma rápida mudança socioeconómica. Em pouco mais de dez anos, o país deu passos significativos, saindo de uma situação de guerra para uma situação de paz, de uma economia estagnada de controlo centralizado, para uma economia de mercado de crescimento económico acelerado, e de um Estado de partido único para uma democracia multi-partidária. O que Moçambique conseguiu excedeu, de diversas formas, as expectativas da comunidade internacional. Mesmo assim, o país está ainda entre os mais pobres, fortemente endividados e mais dependentes da ajuda externa, no mundo. O desafio de reduzir a pobreza e elevar o nível de vida dos seus cidadãos é enorme, mas as perspectivas são agora mais promissoras do que alguma vez foram na história recente de Moçambique. Reforçar estas perspectivas e assegurar a sustentabilidade social e económica do futuro de Moçambique é a tarefa para a qual o Governo e os seus parceiros de desenvolvimento estão agora a dirigir os seus esforços.
Na prossecução dos seus esforços com vista à redução da pobreza, o Governo de Moçambique coloca no topo das suas prioridades de desenvolvimento o investimento no capital humano, através da educação e formação. Esta constitui o instrumento central para a melhoria das condições de vida e a elevação do nível científico e técnico dos cidadãos e o meio básico para a sua intervenção nas tarefas do desenvolvimento socioeconómico do País e na luta pela preservação da Paz.
Sendo o Ensino Técnico-Profissional uma componente importante do Sistema Nacional de Educação, que tem por missão garantir aos cidadãos o acesso a uma formação científico-técnica, altamente qualificada, para responder às necessidades do desenvolvimento económico e social, a estratégia de desenvolvimento do Ensino Técnico Profissional é parte integrante do Plano Estratégico de Educação. Nela se identificam as opções e acções prioritárias de intervenção do Governo e seus parceiros internos e externos, visando ajustar a formação técnico-profissional aos desafios do desenvolvimento económico do país.


2. RAZÓES DO SURGIMENTO DO ENSINO TÉCNICO PROFISSIONAL
O ensino técnico e profissional surgiu e desenvolveu-se por necessidade do sistema produtivo resultante da revolução industrial durante o século XIX de forma não integrada no ensino clássico e humanista existente verificando-se, até, uma distinção profunda quanto aos conteúdos e fins a que ambos se destinavam e também quanto à origem dos alunos que os frequentavam. Assim, enquanto o ensino humanista era frequentado pela aristocracia e pela alta burguesia o ensino técnico e profissional destinava-se quase em exclusivo às classes populares urbanas ou às classes rurais de maiores aspirações (Rocha, 1987). Estes princípios de correspondência entre conteúdos e necessidades funcionais e entre a sua frequência pelos alunos dos grupos sociais mais desfavorecidos manteve-se ao longo de todo o século XX e disso deram conta vários estudos durante o último quartel deste século.

3. O ENSINO TÉCNICO PROFISSIONAL EM MOÇAMBIQUE

3.1. Política Geral
De acordo com a Política Nacional de Educação e Estratégias de Implementação, promulgada pelo Conselho de Ministros da República de Moçambique (Resolução nº 8/95 de 22 de Agosto de 1995), o Ensino Técnico tem a responsabilidade de formar os operários e técnicos necessários devidamente qualificados, para responder às necessidades de mão-de-obra qualificada para os diferentes sectores económicos e sociais do país. Assim, os cursos técnico-profissionais serão planificados de modo a reflectir as necessidades do desenvolvimento da economia nacional e têm um carácter terminal.
A prioridade, em termos de expansão, centrar-se-á na reabertura das Escolas de Artes e Ofícios e Elementares Agrícolas em razão do papel que as mesmas deverão desenvolver na reactivação do tecido produtivo nas zonas rurais e fixação das populações. Nos outros níveis do Ensino Técnico, será mantida a actual rede de escolas priorizando, no entanto, a introdução de melhorias qualitativas através de medidas que incluam a racionalização da estrutura de especialidades no nível básico e o apetrechamento de oficinas e laboratórios.
Em todas as políticas do desenvolvimento do Ensino Técnico, atenção especial será dada ao incremento da participação da rapariga.

3.2. Objectivos do Ensino Técnico Profissional
A referida promulgação do Conselho de Ministros da República de Moçambique, Resolução nº 8/95 de 22 de Agosto de 1995 (pág. 34), prevê os seguintes objectivos do Ensino Técnico Profissional:
a) Assegurar a formação integral e técnica dos jovens em idade escolar, de modo a prepará-los para o exercício de uma profissão;
b) Desenvolver nos jovens as qualidades básicas de personalidade, em particular, educando-os a assumir uma atitude correcta perante o trabalho;
c) Desenvolver capacidades de análise e síntese, de investigação e inovação, de organização e direcção científica do trabalho;
d) Desenvolver conhecimentos sobre a saúde e nutrição e a protecção do ambiente.

3.3. Situação Actual do Ensino Técnico Profissional
Ao contrário da Educação Geral que, em primeiro lugar, tem por objectivo primordial dar conhecimentos gerais e princípios com uma vasta aplicação, o Ensino Técnico-Profissional está, primeiramente, organizado para permitir a aquisição de competências, conhecimentos, valores e atitudes, os quais são necessários para as pessoas exercerem uma determinada profissão ou ocupação.
Em Moçambique o Ensino Técnico Profissional compreende três níveis: O elementar, o básico e o médio. A duração dos cursos varia de três a quatro anos de acordo com a área ou ramo e o nível. A organização curricular dos cursos técnicos compreende quatro áreas: a formação geral, a formação básica, a básica específica e a de especialidade.
O ensino técnico tem um carácter terminal. Pelo facto de também ter como objectivo proporcionar os conhecimentos necessários para o prosseguimento de estudos, com a actual organização curricular, a componente de formação geral e básica acaba reduzindo as possibilidades de uma maior profissionalização dos alunos.
Até 2001, a rede de instituições públicas e privadas de Educação Técnica Profissional era constituída por 65 escolas e institutos (39 tuteladas pelo Ministério de Educação, 22 por outros ministérios e 10 pertencentes a grandes empresas públicas e privadas).

3.3.1. Problema Central do Ensino Técnico Profissional
Apesar dos esforços desenvolvidos, o país não dispõe ainda de um sub-sistema de Ensino Técnico Profissional que possa responder eficazmente aos complexos desafios da fase actual de desenvolvimento socioeconómico.
Portanto, o principal problema do Ensino Técnico Profissional resume-se no facto do Sub-Sistema não reunir, presentemente, as condições necessárias para satisfazer, quantitativa e qualitativamente, as necessidades actuais e futuras do mercado de trabalho formal e informal.

3.3.2. Principais Causas do Problema Central
As principais causas do problema central são: o limitado acesso dos cidadãos ao Ensino Técnico Profissional, a baixa eficiência, a baixa eficácia e a fraca relevância do sub-sistema.

3.3.2.1. Limitado Acesso dos Cidadãos ao Ensino Técnico Profissional
Os principais indicadores deste problema resumem-se no seguinte:
· A rede de instituições públicas de formação tuteladas pelo Ministério da Educação (39 instituições) absorve pouco mais de 1% da população em idade escolar (31.000 efectivos em 2001);
· Em 2001 concorreram 4.769 candidatos aos cursos de nível médio da rede pública de formação (tutelada pelo Ministério da Educação) e foram admitidos 1.464, os quais correspondem apenas 30,7% dos candidatos;
· A rede de instituições de formação de Ensino Técnico Profissional tuteladas por outros Ministérios e/ou empresas públicas ou privadas (33 instituições absorve cerca de 5000 efectivos em 2001, uma porção insignificante (0.19%) da população em idade escolar;
· Os Cursos de nível médio estão limitados a 6 províncias do país;
· As zonas rurais estão desprovidas de Escolas de Artes e Ofícios e elementares de agricultura;
· Participação da rapariga no Ensino Técnico Profissional quase insignificante (cerca de 20%).

3.3.2.2. Baixa Eficiência
A baixa eficiência é um problema comum a muitas instituições de ensino e de formação em Moçambique, mas o problema é avaliado como sendo particularmente severo no ensino técnico básico.
Os principais indicadores (rede de escolas geridas pelo Ministério da Educação) deste problema são:
· Taxa média de aprovação – 50%;
· Taxa média de repetência – 30%;
· Taxa média de desistência – 20%:
· De 1000 novos ingressos apenas 220 concluem o curso em 3/4 anos;
· Graduados em 2000 representaram apenas 7% dos efectivos escolares.

3.3.2.3. Baixa Eficácia
A baixa eficácia é constatada pela falta de correspondência entre a qualidade dos graduados e os objectivos definidos nos curricula, com maior gravidade em termos de habilidades práticas, particularmente no curso nocturno.
Os principais indicadores deste problema são:
· A maior parte das escolas está desprovida de condições básicas em termos oficinais e laboratoriais. Apenas 8 instituições da rede pública de formação (cerca de 20%) reúnem boas condições para a realização de práticas oficinais e laboratoriais;
· Os estudantes do curso nocturno não têm aulas práticas e laboratoriais;
· O elevado número de alunos por turma (por vezes mais de 55 no 1º ano) não permite a realização de aulas práticas de forma eficaz;
· A falta de livros, manuais e outros meios de ensino-aprendizagem, aliada ao modelo pedagógico tradicional (centrado no professor nos conteúdos e baseado na transmissão de conhecimentos), tem contribuído para a limitada aprendizagem dos alunos.

3.3.2.4. Baixa Relevância do Sub-sistema

Existe um desajustamento entre a procura e a oferta de profissionais, tanto em termos de níveis como em termos de competências e conhecimentos. A situação actual é um paradoxo: enquanto as instituições de formação produzem candidatos com formação pouco relevante para o mercado de trabalho, a um custo relativamente elevado (devido à baixa eficiência), certas competências básicas (fundamentalmente para os sectores da economia, administração e serviços, indústrias de ponta, agro-indústrias e desenvolvimento rural), extremamente necessárias, não estão disponíveis.
A fraca adequação formação/emprego deve-se, em particular, aos seguintes factores:
· Os curricula da maioria dos cursos foram concebidos há cerca de 20 anos;
· Formação orientada quase que exclusivamente para o sector moderno da economia e para o emprego formal onde os postos de trabalho estão pouco disponíveis;
· Formação pouco orientada para a promoção de auto-emprego e de criação de pequenas iniciativas económicas, quer no meio urbano, quer no rural;
· Sistema de aprendizagem na empresa inexistente, limitada formação contínua e aprendizagem tradicional não-potencializada;
· Fraca relação com o mundo do trabalho e com os empregadores. As empresas estão ausentes da gestão das instituições de formação, assim como de todas as fases do processo formativo (desde a concepção à avaliação dos cursos);
· A ausência de informação sobre o mercado de trabalho não tem permitido fazer um ajustamento da oferta de formação à procura de habilidades e competências profissionais;
· Falta de mecanismos que possam promover a adequação, formação/emprego. Não existem serviços de orientação profissional, os estágios em empresas são raros e não se faz o follow up e o feed-back da formação junto do mercado de emprego.

3.4. Estratégias do Ensino Técnico Profissional
De acordo com a Estratégia do Ensino Técnico-Profissional (2002-2011), aprovada pelo Conselho de Ministros da República de Moçambique em 20 de Dezembro de 2001, a presente Estratégia de Desenvolvimento do Ensino Técnico-Profissional em Moçambique, sistematiza as acções prioritárias, com vista a capacitar o sistema de formação para responder de maneira adequada aos desafios que se lhe colocam a equipar os diferentes sectores económicos.
A formação de quadros e de profissionais qualificados a todos os níveis deverá ser resultado de consensos entre o Governo e os parceiros sociais e duma planificação cuidadosa, a curto, médio e longo prazo.
Nesta perspectiva, a formação técnico-profissional deverá contribuir para uma satisfação da procura de habilidades e competências profissionais no mercado de trabalho e de emprego que resulte no aumento dos níveis de produtividade e de rendimento das indústrias, proporcionando aos jovens e adultos, para os quais muitas vezes não existem vagas no mercado de trabalho formal, habilidades e capacidades para desenvolverem pequenas iniciativas de empreendimentos económicos.

3.4.1. Missão
O Ensino Técnico-Profissional tem por missão garantir aos cidadãos o acesso a uma formação científico-técnica altamente qualificada, para responder às necessidades do desenvolvimento económico e social.

3.4.2. Visão
O Conselho de Ministros prevê que, nos próximos 10 anos, o Ensino Técnico-Profissional seja confrontado com a necessidade e oportunidade de transformar a forma como se processa o desenvolvimento da força de trabalho nacional. Sendo assim, a nossa “Visão” é que o Ensino Técnico Profissional desenvolver-se-á e transformar-se-á num sub-sistema:
· Flexível, articulado, inovador, dinâmico, autónomo e sustentável;
· Reconhecido, valorizado e comparticipado por todos os parceiros sociais (Governo, sector privado, sociedade civil e famílias);
· Com capacidade de adaptação e resposta às mudanças que se registam no mercado de trabalho formal e informal;
· Implementado numa rede de instituições de formação prestigiadas, autónomas e equitativamente distribuídas pelo país;
· Acessível a um número cada vez maior de cidadãos em idade escolar e adultos com um maior equilíbrio de género;
· Oferecendo programas de formação flexíveis, que promovam competências profissionais, relevantes e o desejo de aprendizagem ao longo da vida, preparem os indivíduos para o mundo do trabalho (emprego e auto-emprego) e para os aspectos gerais da vida;
· Que contribua para o Desenvolvimento dos Recursos Humanos de Moçambique e, por conseguinte, para o aumento dos níveis de produtividade e de rendimento dos diferentes sectores económicos e sociais;
· Com um sistema de Avaliação e Certificação apropriado e que corresponda aos padrões nacionais, regionais e internacionais.

3.4.3. Objectivos Estratégicos
A Estratégia de desenvolvimento do Ensino Técnico-Profissional (2002-2011), é parte integrante do Plano Estratégico de Educação (1999-2003) e do PARPA (2001-2005) Por forma a materializar a visão e a missão do Ensino Técnico-Profissional, a estratégia assenta nos três grandes objectivos estratégicos do Plano Estratégico de Educação (Expansão do Acesso, Melhoria da Qualidade de Formação, Desenvolvimento Institucional), a partir dos quais serão desenvolvidas acções que marcarão o processo de transformação do Ensino Técnico Profissional.

a) Expansão do Acesso: Aumentar o acesso às oportunidades de Educação Técnico Profissional a um número cada vez maior de cidadãos e reduzir as disparidades geográficas e de género.

b) Melhoria de Qualidade de Formação: Desenvolver um Ensino Técnico Profissional flexível e articulado, que garanta uma formação científico-técnica de qualidade, orientada para o mercado de trabalho (emprego e auto-emprego), considerando as possibilidades de prossecução de estudos.

c) Desenvolvimento Institucional: Estabelecer um quadro legal, normativo e institucional apropriado para a administração e gestão do Ensino Técnico Profissional, através da criação de mecanismos de coordenação e participação dos parceiros sociais, na tomada de decisões sobre o desenvolvimento do sub-sistema.























4. CONCLUSÃO
A Educação Técnico-Profissional (ETP) é um elemento essencial no Sistema
Educativo, cujo objectivo chave é o de contribuir para a criação de uma força de trabalho qualificada, essencial para reforçar o crescimento económico e tirar os cidadãos e as comunidades da situação de pobreza. As razões incluem aspectos relacionados com o acesso, relevância, eficiência e eficácia, coerência e coordenação.
As preocupações relativamente à relevância espelham as do Ensino Secundário Geral. Os currícula estão em processo de revisão, no quadro da Reforma da ETP, com envolvimento dos empregadores, sindicatos e outros parceiros. Este processo permitirá a adequação dos currículos às actuais necessidades do mercado, colmatando os problemas detectados relativamente à falta de capacidades práticas, como também de exposição a tecnologias modernas, fraca fluência em Português e línguas estrangeiras, e fraca capacidade de gestão ou de supervisão.
O baixo nível de capacidades é também um impedimento para os graduados que queiram optar pelo auto-emprego. Isto é agravado pelas fracas qualificações, em geral, dos instrutores e os melhores, muitas vezes, abandonam o ensino em troca de empregos melhor pagos. Não há programas de ETP alternativos para os que terminam o Ensino Primário ou para grupos de desistentes. As instituições de formação têm pouca autonomia e sofrem de má gestão. Os orçamentos das escolas são insuficientes, e os poucos fundos alocados são, frequentemente, mal geridos.
Como reflexo da fraca eficiência e eficácia, as taxas de repetição, desistência e de insucesso são altas. Acima de tudo, a média das taxas de desistência é de 40-45%, com variações substanciais entre os diferentes níveis e tipos de cursos. Para além disso, muitos alunos entram para os programas da ETP porque não conseguem arranjar vaga nas escolas secundárias normais. A ETP constitui uma alternativa para a obtenção do nível académico. Seria mais eficaz em matéria de custos e, em última análise, mais proveitoso dar vagas a estes alunos nas escolas secundárias.









5. BIBLIOGRAFIA
____ Estratégia do Ensino Técnico-Profissional em Moçambique (2002-2011): Aprovada Pelo Conselho de Ministros da República de Moçambique a 20 de Dezembro de 2001.
____ Política Nacional de Educação e Estratégias de Implementação: Resolução nº 8/95 de 22 de Agosto de 1995. Conselho de Ministros da República de Moçambique.
ROCHA, F. (1987). Fins e objectivos do sistema escolar português de 1820 a 1926. Aveiro: Liv. Estampa.
.

3 comentários:

  1. MICHELL NKANDA

    GOSTEI DO TRABALHO.
    A QUALIDADE ESTA NO PENSAR FAZER E FAZER... FOI O QUE ACONTECEU NESTE CASO...

    SAUDAÇÕES.

    ResponderExcluir
  2. Alo Salatinho, eu sei que escreveste a boms anos atras mas depois de ler gostaria tanto de entrar em contacto con sigo urgentimente. tenho umas propostas para o ensino tecnico professional e gostaria da tua ajuda. contact-me chicoj.cook@hotmail.com

    ResponderExcluir